Projetos

Biblioteca Nossa Senhora do Ó


Detalhes do Projeto:

Arquitetos:

Tiago Castelo Branco Lourenço (Equipe Tapanhuacanga)

Colaboradores:

Maria das Graça Moura (Orientadora)

Ano do Projeto:

2008

Local:

Sabará, MG, Brasil

Imagens:

Guy François Lapouble Côrrea e Tiago Castelo Branco Lourenço

Outras Informações:

Maquete: Carlos Roberto de Souza Soares, Diego Fonseca Pereira, Olcimar Campos, Mariana Spinoza LApouble, Tiago Castelo Branco Lourenço e Warley Wilson da Silveira.
Concurso: Asades 2008 - Mendonza - Argentina


 


 Memorial Descritivo 

A Arquitetura e seu Contexto 

A Villa Real de Nossa Senhora da Conceição de Sabará foi fundada pelo bandeirante Borba Gato, genro do grande descobridor das Minas Gerais, Fernão Dias Paes Leme, na segunda metade do século XVII.

A ocupação de toda a região central do Estado de Minas Gerais, onde está localizada a cidade de Sabará, se deu no contexto da procura pelo ouro e outras pedras preciosas de interesse da Coroa Portuguesa.

Sabará é palco de um dos maiores acervos arquitetônico, urbanístico e cultural do Estado de Minas Gerais, testemunhos de um passado que atestam a sua importância como um dos importantes centros urbanos setecentista da capitania das Minas Gerais, relevância ainda encontrada na localidade. Para Affonso Ávila:

“A cidade de Sabará e sua área rural oferecem ao estudioso um campo riquíssimo e diversificado para o levantamento e análise das formas arquitetônicas e ornamentais que demarcaram a evolução da arte religiosa em Minas Gerais (…)” (ÁVILA, 1984, p.33)

Dentre as cidades que compõem a Região Metropolitana de Belo Horizonte, Sabará foi a de maior importância até o final do século XIX quando a capital mineira foi transferida de Ouro Preto para Belo Horizonte. Para o poeta Cláudio Manuel da Costa, Sabará é a “primeira povoação das Minas Gerais”, segundo Ávila é um lugar:

“(…) de uma arte, especialmente no que tange à talha, que demonstra o nível de fervor religioso e gosto estético de habitantes que começavam a evidenciar, com a suntuosidade de seus templos, o desejo social de fixação. (…)” (ÁVILA, 1984, p.33)

O centro histórico de Sabará desenvolveu-se nas encostas que formam o vale de um ribeirão de mesmo nome, é uma cidade encaixada entre as montanhas no decorrer das margens do curso d água. (Imagem 4)

A conformação urbana da cidade de Sabará se deu no entorno de estradas e caminhos que atendiam as demandas por vias de circulação para a exploração aurífera na região.

A evolução urbana de seu centro histórico ocorreu a partir de um processo de conurbação entre pequenas vilas à beira dos caminhos. (Imagem 5)

As maiorias dos lugarejos que originariam a Villa da Nossa Senhora da Conceição de Sabará encontravam-se a margem direita desse ribeirão, na margem esquerda havia as localidades de Arraiais Velhos e Tapanhuacanga.

Os antigos vilarejos são, atualmente, bairros do distrito sede de Sabará.

Tapanhuacanga se encontra na porção leste do conglomerado urbano do distrito sede do município, é atualmente constituída por alguns dos bairros do centro histórico.

Um dos edifícios importantes de seu patrimônio material é a Igreja Nossa Senhora do Ó e seu largo de entorno. A igreja, um dos importantes exemplares da Arquitetura Barroca Brasileira, é um dos remanescentes dos primórdios de ocupação do que hoje constitui o Estado de Minas Gerais.

Nas palavras do poeta Affonso Ávila, “(…) a Capela de Nossa Senhora do Ó, louvada universalmente pela sua beleza peculiar que reúne graça arquitetônica e requinte ornamental (…)”. (ÁVILA, 1984, p.33)

A capela tem também como importante coadjuvante na construção de sua beleza o seu entorno imediato, o Largo da Igreja Nossa Senhora do Ó. O conjunto arquitetônico com seu casario e a igreja no centro conforma uma ambiência urbana que valoriza ainda mais o templo religioso, evidenciando suas características barrocas.

A proposta que será apresentada é construção de um prédio anexo à Igreja Nossa Senhora do Ó. O edifício proposto busca uma relação dialógica com o entorno, numa linguagem contemporânea, filha de seu tempo. Procura uma sobriedade compondo junto com as edificações lindeiras ao largo da igreja um cenário para o templo religioso. Um edifício que participa em silêncio de uma composição urbana já posta.

O uso proposto ao novo prédio é o de abrigar uma biblioteca especializada em Arquitetura, Arte e Barroco.

Recentemente, Sabará promulgou seu plano diretor. Esta legislação coloca dentre seus objetivos estratégicos alguns pontos importantes para construção da proposta apresentada: I – a promoção do bem dos habitantes de Sabará; II – a proteção do patrimônio histórico, artístico, cultural e ambiental; IV – o estímulo as atividades econômicas, de acordo com as potencialidades municipais.

A proposta de construção da Biblioteca Nossa Senhora do Ó compartilha desses objetivos estratégicos vislumbrados na legislação municipal.

O Largo da Igreja do Ó é tratado na legislação citada, como uma das áreas a ser submetida a um processo de intervenção dentro do distrito sede do município. Essa intervenção procura promover e participar da requalificação deste espaço, contribuindo para destacar a sua importância enquanto patrimônio cultural nas instâncias municipal, estadual, federal e internacional.

A Biblioteca Nossa Senhora do Ó é uma proposta que busca atender as diretrizes apontadas no plano diretor, o projeto do edifício almeja participar da implementação dos anseios da população sabarense expressos em sua lei municipal.

Deixemos as intenções no momento, e vamos conhecer um pouco mais de perto a proposta arquitetônica.

A solução espacial 

Um edifício contemporâneo num sítio histórico é geralmente polêmico.

Para aqueles que utilizam aquele espaço cotidianamente, o edifício é visto como uma intervenção estrangeira, uma manifestação de sujeitos descolados daquela sociedade.

Para aqueles estrangeiros que visitam o sítio histórico com um olhar de quem vai ao cemitério, o prédio é percebido como a profanação de um morto, e tal situação é vista como indigna.

Alguns estrangeiros percebem o edifício contemporâneo como uma agressão a sua identidade, identidade esta construída a partir de um discurso inventado sobre uma tradição comum de toda uma coletividade. Para esse estrangeiro, espacial e temporalmente, o edifício contemporâneo é uma ameaça, confere uma dinâmica a um ambiente, a priore, estático.

O prédio da biblioteca propõe uma releitura do espírito barroco. No Barroco, o homem parte da escuridão e encontra a luz, parte do ambiente profano e encontra a verdade no sagrado. Na Biblioteca a verdade está no conhecimento.

Um prédio misterioso que se revela somente para aqueles que o acessam, saindo da obscuridade, da ignorância e encontrando a luz no conhecimento, um espaço introspectivo que se abre para o mundo.

Nesta proposta, o edifício que abrigará a biblioteca terá quatro níveis, um subsolo e mais três pavimentos.

O subsolo será destinado a abrigar a maior parte do acervo da biblioteca, bem como a mapoteca e salas de estudos entre as prateleiras de livros. Estes espaços serão mais reservados, um local onde o silêncio dos livros predominará. A área ocupada pelo subsolo será de 1000m2, sendo que metade desta área será coberta pelos mezaninos dos andares superiores.

O primeiro pavimento será a porta principal do edifício, a entrada. Para acessar o prédio têm-se duas opções, pelo Largo da Igreja Nossa Senhora do Ó, atravessando um corredor até adentrar a recepção, ou passando sob o passadiço junto à Rua Joaquim Siqueira.

No primeiro pavimento, teremos a recepção e um espaço reservado para exposições junto a ela. Logo após, temos uma área reservada para um acervo específico sobre a cidade em que a biblioteca está instalada, o acervo Sabará. Logo após, uma sala para estudos individuais, estes espaços se encontram junto ao vazio de onde se visualiza o acervo no subsolo.

Voltado para a praça interna, têm-se espaços reservados para o público infantil, sendo eles, um espaço para exposição, brinquedoteca, informática e multimídia. Próximo à recepção, também voltado para a praça interna, teremos alguns espaços de apoio para o público leitor: banheiros, enfermaria e uma sala reservada para reprodução de cópias xerográficas.

Ainda no primeiro pavimento, teremos um cine-auditório, um espaço que pretende atender às demandas de funcionamento da biblioteca e à carência por este tipo equipamento na cidade. A área ocupada pelo primeiro pavimento é de 1480 m2.

O acesso ao segundo pavimento será feito pela escada ou pelo elevador, este reservado há portadores de necessidades especiais. Neste pavimento teremos o setor de periódicos que compartilha o mesmo espaço reservado para os estudos em grupo, banheiros, sala de vídeo, sala para os estudos em braile e uma sala para os estudos informatizados. Todas essas salas estarão em contato com o vazio sobre o acervo no subsolo.

Tanto do primeiro pavimento quanto do segundo poderá ser visualizado o Largo da Igreja Nossa Senhora do Ó, através do pano de vidro voltado para este espaço urbano. Protegendo este pano de vidro teremos um brise-soleil, elaborado através de um engradamento de varas de eucalipto disposto como numa estrutura de pau-a-pique, tecnologia construtiva adotada na região durante o Período Colonial.

Esse detalhe arquitetônico cria um grande muxarabi, elemento adotado na arquitetura islâmica para proteger os ambientes internos das casas, permitindo ao usuário a visualização da rua sem perder sua privacidade. Esse elemento foi também adotado na arquitetura colonial brasileira, e retomado aqui em uma releitura plástica contemporânea, almejando assim uma integração com uma lógica de ocupação espacial já consolidada no sítio objeto da intervenção.

No terceiro pavimento, teremos uma praça esta, composta por um grande deck de madeira de onde surgem mesas e assentos, estes poderão ser utilizados pelos usuários para buscar diferentes visadas da cidade de Sabará e, quem sabe, elaborar croquis, eternizando assim em um papel, um olhar sobre a cidade colonial. A Praça do Croqui ocupará uma área de aproximadamente 1000m2, sendo metade ocupada pelo grande deck e a outra por um gramado de onde surgem sheds, responsáveis pela ventilação do bloco da biblioteca.

Ainda no terceiro pavimento, teremos um pavilhão lindeiro à Rua Joaquim Siqueira. Este bloco se encontrará apoiado sobre o bloco da biblioteca na sua extremidade norte, e sobre o terreno e o cine-auditório, em sua extremidade sul, formando um passadiço sobre o acesso à biblioteca e à praça interna no primeiro pavimento.

Esse pavilhão será usado pelos setores administrativo e de suporte ao acervo da biblioteca, ele ocupará uma área de aproximadamente 700m2. As salas deste pavilhão serão voltadas para a praça interna na fachada leste, e atravessadas por um corredor voltado para a Rua Joaquim Siqueira na fachada oeste.

A opção em ocupar as extremidades oeste, norte e noroeste do terreno se deve a uma ocupação preexistente no local, composta por três residências e por pátios cimentados. A porção leste e sul do terreno já são ocupados por várias árvores, que serão preservadas e integradas à praça interna da biblioteca. Esse espaço será aberto ao público e poderá ser acessado sob o passadiço da Rua Joaquim Siqueira.

A praça interna remeterá aos quintais presentes nas casas da região, onde o volume arquitetônico ocupa a área junto à rua, preservando os fundos do terreno para a ocupação com hortas e árvores.

Todo o projeto de arquitetura deve buscar atender a princípios sustentáveis.  Apresentaremos a seguir alguns elementos e tecnologias que serão aplicados no prédio da biblioteca para que tais condições sejam efetivadas.

Preocupações sustentáveis 

O sol e o edifício.

Para análise da insolação sobre o edifício, foram realizados ensaios com os objetivos de verificar como o edifício se relaciona com o entorno, e assim buscar soluções para suas fachadas.

O ensaio elencou algumas datas para proceder à avaliação, o equinócio, ou seja, os dias 21 de março e 21 de setembro, o solstício de inverno, dia 21 de junho e, o solstício de verão, dia 21 de dezembro. Para cada um desses dias foi verificada a incidência solar nos seguintes horários: 8h30min, 12h e 15h.

Pode ser verificado através do ensaio que a incidência solar sobre o edifício se dá a maior parte do ano na fachada noroeste e nordeste. A fachada sudoeste e sudeste recebem sol durante boa parte do dia entre meados do mês de novembro e meados do mês de janeiro.

No equinócio, às 8h30min, teremos uma incidência solar na fachada nordeste da biblioteca, e na fachada leste do pavilhão administrativo. O brise-soleil nesta fachada foi colocado na vertical, como a cidade de Sabará esta a 23 ½ graus sul em relação ao Equador, o sol nesse dia passará ao norte do edifício. A fachada nordeste recebe uma incidência solar lateral, o brise-soleil disposto na vertical permitirá um sombreamento da fachada mais eficiente.

A fachada noroeste também nesse horário não recebe uma insolação que necessitará a proposição de estratégias de proteção. O edifício às 8h30min gera uma sombra sobre as residências lindeiras à Rua Joaquim Siqueira.

No equinócio, às 12h, a fachada noroeste é a que recebe a maior incidência solar. Pela posição e altura do corpo celeste, o brise-soleil nesta fachada será disposto na horizontal gerando um sombreamento eficiente da fachada. A fachada oeste do pavilhão administrativo será protegida por um brise-soleil disposto na vertical, nesse horário a fachada encontra-se sombreada.

Às 15h o sol incidirá na fachada noroeste e, na oeste, as fachadas têm os brise-soleils dispostos, como descritos anteriormente, para garantir a eficiência da proteção das fachadas nesse período.

No solstício de inverno, às 8h30min, o sol incidirá nas fachadas nordeste e noroeste, as fachadas serão protegidas pela disposição dos brise-soleils. O edifício gerará uma sombra mais significativa sobre as residências lindeiras a Rua Joaquim Siqueira.

No mesmo dia, às 12h, as fachadas nordeste e noroeste serão atingidas pela incidência solar, a fachada noroeste é a mais prejudicada nesse horário, entretanto, o brise-soleil disposto na horizontal e posicionado no exterior do prédio será eficiente no sombreamento e proteção da fachada.

Às 15h, a fachada oeste do pavilhão administrativo será a que recebe diretamente a incidência solar, o brise-soleil disposto na vertical garante parte da proteção dessa fachada. Dentro do pavilhão, a fachada protegerá o corredor de acesso às diferentes salas. O corredor foi colocado nesta posição para garantir o conforto térmico das salas que se encontram protegidas pelo brise-soleil e pelo colchão de ar formado pelo corredor. Essas salas, pelo uso proposto, serão ocupadas a maior parte do dia sendo necessário um maior cuidado em sua proteção.

No solstício de verão, às 8h30min, o edifício receberá a insolação solar nas fachadas sudeste, sudoeste e leste. A fachada leste é protegida com o brise-soleil disposto na vertical, como o sol incide na fachada, lateralmente, o equipamento é eficiente em sua proteção. As fachadas sudeste e sudoeste são protegidas por marquises no primeiro pavimento e, no segundo pavimento, são pelas árvores que compõem a praça interna da proposta.

A incidência solar às 12h nas fachadas sudeste e sudoeste são protegidas, no segundo pavimento, através de uma pequena marquise junto às salas do estudo informatizado, do braile e da sala de vídeo, e no primeiro pavimento é igualmente protegido pela mesma marquise. Os dois andares têm parte da luz incidente filtrada pelas árvores da praça interna.

Às 15h a fachada oeste e a fachada noroeste são as que recebem a maior incidência solar. A fachada noroeste recebe uma incidência lateral, não sendo muito prejudicada.

A escolha pelo uso de eucalipto na construção dos brise-soleils de proteção do prédio deve-se a questões plásticas, conforme mencionado anteriormente e, também por considerá-lo um tipo de madeira de reflorestamento presente na região.

Além desses fatores, a utilização desse material renovável que tem um baixo custo energético em seu processamento, fornece um isolamento térmico muito mais eficiente do que os metais ou o concreto, é relativamente fácil para executar o trabalho de instalação, exigindo ferramentas simples, e da forma como se apresenta e insere-se neste projeto, favorecerá ainda mais a sua durabilidade.

O ar e o edifício

Um prédio destinado a ser uma biblioteca exige alguns cuidados especiais, o conforto da edificação deve atender as demandas dos usuários leitores e dos funcionários, mas também deve atender as demandas de preservação dos livros.

A questão da umidade relativa do ar é um dado a ser considerado na elaboração de tecnologias que garantam a preservação dos livros. Sabará é uma cidade com clima seco, entretanto, durante a primavera e o verão apresenta altos índices pluviométricos e é para esses períodos que a proposta busca dar soluções, garantindo uma boa ventilação do edifício, sem lançar mão de tecnologias que demandem altos custos energéticos.

A procura por alternativas que necessitem menos da infraestrutura de energia elétrica disponível é uma atitude projectual importante na busca por uma relação sustentável do homem com a natureza. No projeto da biblioteca, alternativas para evitar o uso do ar-condicionado foram buscadas através de alguns detalhes descritos a seguir.

A fachada noroeste é uma das mais atingidas pela incidência solar no decorrer dos dias e do ano, para ventilar este lado do prédio será plantado grama no decorrer do passeio lindeiro, possibilitando assim um resfriamento natural do ar que percorre o pano de vidro e os brise-soleils de varas de eucalipto.

Parte desse ar que percorre a fachada será captado por um basculante na parte inferior do pano de vidro. Esse ar percorre o vazio sobre o acervo ventilando os dois pavimentos internos da biblioteca, e aproveitando o efeito chaminé, ele é expulso por aberturas feitas na cobertura, através de sheds nos jardins e aberturas no deck de madeira da praça do croqui.

O basculante foi posicionado acima do acervo para que este não seja ventilado pelo ar externo, evitando assim uma umidificação do ar que prejudicaria a preservação do acervo.

Para evitar a umidificação do acervo é proposta a construção de um fosso de isolamento no entorno de todo o subsolo, gerando assim um colchão de ar entre as paredes do subsolo e o solo que o envolve.

As águas de chuva e o edifício.

A água é um dos elementos que foi objeto de reflexão para a elaboração do projeto da biblioteca. A reutilização das águas manipuladas no edifício e o aproveitamento das águas de chuva foram às estratégias adotadas para não sobrecarregar a infraestrutura de água potável disponível.

O complexo arquitetônico que conforma a biblioteca apresenta uma grande área de projeção que favorece para o recolhimento das águas pluviais e, consequentemente, a sua condução para os reservatórios.

As coberturas da biblioteca e do pavilhão administrativo serão os responsáveis pelo recolhimento das águas pluviais. A água que incidir sobre as coberturas será submetida a uma microdrenagem superficial, esse processo irá levar a uma filtragem do fluido.

A drenagem se dá através de uma camada de grama, sobre uma camada de areia e logo após uma camada de brita. Sob os materiais citados encontrar-se-á um conjunto de canos drenantes, que recolhem a água e transportam-a para um condutor nas extremidades das lajes. Esses condutores levam as águas recolhidas para o reservatório subterrâneo de águas pluviais.

O reservatório subterrâneo de águas pluviais é o lugar onde se armazena a maior parte da água utilizada no edifício. Esse reservatório é subterrâneo, pois assim sem o calor e a luz há o retardamento da ação das bactérias presentes nas águas pluviais, devido ao fato dessas águas terem uma grande presença de material orgânico.

A água do reservatório subterrâneo é bombeada para outro superior, após esse processo, é feita a distribuição por gravidade para os locais onde não é necessária a utilização de água potável.

Essas águas pluviais reservadas serão utilizadas para o acionamento de descargas sanitárias, limpeza do prédio, manutenção das áreas verdes e rega dos jardins nas praças interna e do croqui, também será considerada como a água de combate a incêndio.

As águas recuperadas.

Outra estratégia de aproveitamento das águas, para o bom funcionamento do edifício, é a utilização das águas recuperadas nos lavatórios dos banheiros.

Pela legislação brasileira, em alguns locais, como o lavatório dos banheiros, deve-se adotar a água potável para o consumo.

Essa água utilizada nos lavatórios dos banheiros da biblioteca será recolhida e, ao invés de ser encaminhada para a tubulação que conduz as águas servidas, conduzida a outra tubulação que abastece o reservatório de água recuperada.

Esse reservatório encontra-se no banheiro do andar abaixo, ele é responsável pelo abastecimento das descargas das bacias sanitárias e dos mictórios.

As bacias sanitárias dos banheiros são do modelo que apresenta a caixa de descarga acoplada, esta é uma peça necessária para o bom funcionamento do sistema, pois, outros modelos não garantem pressão suficiente para o acionamento das descargas sanitárias.

A escolha em colocar o reservatório de água reutilizada no banheiro logo abaixo do lavatório que o abastece, é devido a um controle do uso desnecessário de tubulações, e um gasto enérgico a mais para o bombeamento desta água em sua condução a um terceiro reservatório na cobertura do prédio. Sendo assim o abastecimento dos reservatórios de água reutilizada para as descargas sanitárias se dão por gravidade.

Os banheiros do subsolo são abastecidos pelos banheiros do primeiro pavimento, o mesmo ocorre com os banheiros do primeiro pavimento em relação aos banheiros do segundo pavimento.

O terceiro pavimento apresenta uma diferença, as águas geradas nos lavatórios de seus banheiros abastecem as bacias sanitárias dos banheiros do segundo pavimento, entretanto, suas descargas são atendidas pelas águas de chuva reaproveitadas e, nos períodos de estiagem abastecidos pela água potável.

Todos os reservatórios dos banheiros são também conectados a coluna d’água de chuva reaproveitada, para que esta possa contribuir no abastecimento do reservatório quando a água gerada no andar superior não for suficiente para a demanda.

Quando as águas pluviais, e as águas recuperadas nos lavatórios, não forem suficientes para atender as demandas do prédio, todo o sistema hidráulico da edificação será abastecido pela água potável, ou seja, as alternativas de reaproveitamento de água trabalham paralelas às alternativas já adotadas usualmente, garantindo assim o funcionamento sem a interrupção.

O verde como parte do edifício.

A praça interna, que ocupa a porção leste e sul do terreno em que será erguida a Biblioteca Nossa Senhora do Ó, é um elemento do projeto que já se encontra instalado.

No fundo das residências que hoje ocupam o lote, objeto da intervenção, as árvores compõem os quintais das casas, seguindo uma tradição de ocupação urbana na região que remonta o Período Colonial, conforme citado anteriormente.

A incorporação dessas árvores ao projeto deve-se num primeiro momento, a uma opção por buscar uma linguagem contextualista na intervenção, porém o papel deste elemento extrapola esse objetivo.

A manutenção dessa cobertura vegetal no terreno favorece o ciclo hidrográfico urbano, proporcionando a infiltração das águas superficiais, além disto, mantém também, uma situação climática já consolidada na microregião, devido à existência desse maciço arbóreo.

A presença da praça interna atua junto ao edifício amenizando as transferências de calor entre o exterior e o interior, contribuindo assim para um ambiente confortável para os usuários do prédio.

A massa arbórea da praça interna tem também o papel de absorver e armazenar a umidade que incide sobre a biblioteca, atuando como um elemento que contribui no equilíbrio da umidade relativa do ar dentro do prédio. Este é um fator importante para o uso que se pretende no edifício.

As árvores da praça interna atuam também como brise-soleils naturais, protegendo as fachadas sudeste, sudoeste e leste da incidência solar, especialmente no verão, quando essas são as fachadas mais atingidas, destacando ser esse o período com as mais altas temperaturas durante o ano.

Outro fator que contribuiu para a incorporação da praça interna ao projeto foi a questão do vento dominante, durante a maior parte do ano, ele se dá da direção sudeste para oeste. Este fato proporciona uma brisa agradável no interior do edifício, esta irá percorrer os pavimentos, favorecendo então a não utilização de ar-condicionado em seu interior.

Além do mais, essa área cria mais uma praça no município, favorecendo o cultivo de uma cultura pública e uma prática cidadã pautada pelos princípios sócio-ambientais.

O prédio do infinito absoluto

A biblioteca é uma busca pelo impossível, é o desejo de reunir o universo dentro de uma sala, dentro de um prédio, mesmo uma biblioteca especializada como a aqui proposta, ela nunca se esgota.

Um prédio para uma biblioteca sempre será pouco, os livros que ali habitam têm vida própria, e sempre conduzem suas reflexões por caminhos desconhecidos, por mais fechados que possam parecer, sempre são novas possibilidades, e essas levam a reunião de novos livros, numa lógica infinita de reunião e preservação do conhecimento humano.

A proposta apresentada busca a construção de um prédio do infinito absoluto que congratule a harmonia do conhecimento humano com os elementos primários da natureza.

Em meio a um momento da existência humana em que nos deparamos com os nossos limites ou os limites concretos do mundo em que vivemos, o prédio do infinito absoluto busca uma nova inserção.

Parafraseando Marx e Engels, “[...] os homens são por fim compelidos a enfrentar de modo sensato suas condições reais de vida e suas relações com seus semelhantes. [...]”, os semelhantes podem ser também os elementos da natureza que envolvem a existência humana em suas dimensões biológica, orgânica, social e cultural.

Por fim, um edifício em estrutura de aço e vidro, representando o domínio técnico humano. E uma proteção, em eucalipto, no ar que ventila, na árvore que gera sombra, na água que soluciona as necessidades humanas, elementos primordiais protegendo as certezas humanas.

Imagens do Projeto: